ATOS QUE DESAFIAM A VIDA E A MORTE- Capítulo 4

O Inferno está vazio. Todos os demônios estão aqui na Terra” (William Shakespeare).


Quando as incertezas batem a nossa porta e nos obrigam a aceitar os fatos sem nenhum questionamento, a vida torna-se algo sem um sentido completo. Talvez o que eu esteja dizendo aqui agora não possua o nexo suficiente ou mesmo eu, um cara comum e sem muitas palavras eruditas, não esteja conseguindo me expressar como gostaria. Enfim, o que estou querendo dizer é que no momento em que eu resolvi seguir com aqueles homens estranhos eu já não tinha certeza de mais nada do que poderia acontecer. Nem sabia se eu receberia meu dinheiro. Na verdade, isso já não me importava muito mais. Eu me sentia amedrontado, mais pela minha vida do que pela minha situação financeira.
Seguimos durante o percurso em silêncio. Galeno dirigia com prudência e os caras olhavam o tempo todo para a frente. Ninguém ousou quebrar o silêncio e eu resolvi que faria o mesmo. Permaneci mudo durante os intermináveis sete minutos em que rodávamos pela cidade.
O carro parou em frente ao cemitério municipal da cidade de Capivari, que se localizava bem na entrada do município. Olhei para aquele local desolador, como se sentisse pena do lugar e de seus “habitantes”. Ainda não havia percebido, em meio aos meus devaneios, que o advogado e os dois companheiros haviam descido do carro e me chamavam:
-Chegamos.
-O quê?- respondi, surpreso.
-Fernando, confie em nós. Você está perto de receber o que é seu.
Ainda um tanto contrariado, saí do veículo. Segui com os homens por corredores e mais corredores de túmulos. As fotos variavam: crianças, bebês, idosos, homens e mulheres jaziam em profunda paz em meio a anjos e flores poeirentas, entre mármores gastos pela ação do tempo ou amarelados pela passagem dos anos, mostrando que ali acabava qualquer lapso de poder, ganância ou qualquer coisa e sentimento que o valha. Eu divagava desse modo e, não sei por que, mas o lugar deixava-me um tanto estranho e aéreo.
O sol estava intenso e a caminhada por entre as tumbas parecia ser interminável. Na verdade eu não prestava muita atenção no que acontecia ao redor, mas percebi Galeno lançar um olhar sugestivo ao homem mais baixo. Neste momento, os homens pararam e viraram-se para mim:
-Aqui está, Fernando. Olhe e veja seu dinheiro- disse Galeno, apontando-me um túmulo muito deteriorado.
Me aproximei do local que o advogado apontava. Um túmulo simples, de granito. Não possuía flor, anjo ou decoração que fosse. Estava empoeirado. Quando cheguei ainda mais perto constatei que ele estava aberto. Achei estranho, porém ao aproximar-me ainda mais, para minha surpresa, olhei para dentro e vi um caixão. Aberto.
Não havia ossos, nem cadáver. Dentro havia dinheiro. Muito dinheiro.
O leitor pode achar que a minha consternação parou por aí. Grande engano. Confesso que ao narrar essas memórias sinto-me um tanto atordoado, talvez porque não recuperei de todo o susto que levei. Bom, peço perdão por essas viagens. Voltemos à narrativa.
O caixão estava aberto e repleto de notas de cem. Achei aquilo muito esquisito, afinal, por que raios o dinheiro da compra do meu imóvel estaria no cemitério dentro de um túmulo? Porém, enquanto eu divagava em meus questionamentos ergui os olhos e o susto que levei, rapaz... gelou-me a alma e outras partes do corpo! Bem acima da lápide estava a foto da falecida que habitava anteriormente aquela tumba (agora só tinha dinheiro, aparentemente). Para meu desespero era ninguém menos que...
A bruxa velha que eu tinha visto momentos antes fazendo um ritual macabro.
Naquele momento quase morri de susto. Comecei a tremer feito uma vara verde. Meu coração palpitava em um ritmo frenético de taquicardia e minhas pernas balançavam como se tivessem sido agitadas pelo vento. O vendaval que ressurgia em minha mente trouxe um medo que não consigo descrever até hoje. O engraçado é que por mais racional que eu havia sido em toda a minha vida, nesse momento eu parecia uma menininha assustava.
Eu borrei as calças.
Olhei para meus três companheiros e vi que estavam impassíveis, imóveis como estátuas de mármore. Não sei como estava minha aparência neste momento, mas acredito que não estava nada boa porque Galeno veio até mim com ar preocupado:
-Acho melhor você se sentar para explicarmos melhor essa história.
-Sentar?- eu disse, com a voz falhando horrendamente- Onde eu vou sentar, cara? Vo-você viu a fo-foto? Eu... eu vi essa mulher...
Não sei mais o que eu iria falar ou o que aconteceu logo após isso. Uma nuvem negra como fumaça cobriu meus olhos e desmaiei. Não sei por quanto tempo permaneci desacordado, pois quando acordei estava deitado em uma sofá nos fundos da minha loja. Tive um sobressalto ao notar a presença dos três caras de terno sentados em cadeiras me observando.
-Caras, vocês são loucos ou o quê? Que brincadeira é essa?
Galeno respirou fundo e foi o primeiro a responder:
-Fernando, nós não somos loucos nem nada. Estamos aqui para ajudá-lo. Há algo muito maligno à sua espreita e você está sendo o alvo dessa coisa. Você precisa se proteger e nós estamos aqui para explicar essa história para que possa compreender todos os fatos que tem acontecido com você nos últimos dias.
-Então conte. Agora.
-Nós iremos. Você tem passado por coisas estranhas, sabemos disso. Pesadelos, pressentimentos, visões. Tudo isso tem um motivo para estar acontecendo. E isso está relacionado ao seu passado. Ou melhor: ao de seus antepassados.

CONTINUA...

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